Carlos Martins: Profissional de Investimento Certificado APIMEC CNPI, autor do livro "Os Supersinais da Análise Técnica" (Ed. CampusElsevier, 2010) e sóciofundador do Trader Gráfico.
Vamos abordar o tema de controle operacional em day-trade de mercados futuros no limite da alavancagem. O tema é denso, há muitos conceitos operacionais envolvidos, mas não há nenhum conteúdo de análise técnica ou de tomada de decisão sobre momentos de entrar e sair do mercado. Dada uma situação em que nós já temos uma estratégia operacional e já sabemos como entrar e sair do mercado, a técnica da “Margem Turbo” vai nos levar a explorar essa estratégia no limite do possível, sem arriscar de forma irracional, mas arriscando o suficiente para contar com perdas não fatais durante o processo, semelhante a um “sacrifício” em um jogo de Xadrez.
“Um Sacrifício no Xadrez não é nem um motivo nem um tema tático mas um lance através do qual você entrega deliberadamente material para adquirir vantagem nos lances subsequentes. Sacrifícios usualmente resultam em ganho de material, ameaça ou mesmo concretização de xeque mate.” (https://www.tabuleirodexadrez.com.br/temas-taticos-no-xadrez-sacrificio.html)
Para fazer isso começarei sendo didático e explicando algumas partes deste tema nos tópicos abaixo.
Para operar em mercados de contratos futuros em day-trade não precisamos ter todo o valor financeiro da operação, precisamos ter apenas uma parte. Como operamos com mais dinheiro do que temos, surge o termo “alavancagem”. Dizemos, portanto, que estamos “alavancados” quando operamos day-trade em contratos futuros em uma posição financeira maior do que o nosso financeiro real.
Há muito tipos de contratos futuros, mas os de maior negociação (maior liquidez) são os contratos de Ibovespa Futuro e Dólar Futuro, que estão no centro desta newsletter.
O dinheiro que efetivamente temos em conta recebe o nome de “Margem”. Então, se temos R$ 1.000 na conta da corretora dizemos que temos R$ 1.000 em “margem” operacional na corretora. Mudamos o nome de “financeiro” para “margem” porque ela (a “margem”) pode ser várias coisas, como: ações (Petrobras, Vale, Itaú etc), CDB’s, titulos públicos e muitas outras aplicações de renda fixa ou variável, além do próprio dinheiro. Muitas dessas aplicações usadas como “margem” já possuem suas próprias rentabilidades sozinhas, o que significa que se usadas de maneira racional, essas aplicações poderão render duas vezes, uma da sua maneira original e outra como “margem” nas suas operações de day-trade em mercados futuros. Essa tema específico já foi abordado na newsletter sobre “Margem, Rentabilidade Duplicada e Alavancagem”.
Tanto os contratos de Ibovespa Futuro como os de Dólar Futuro possuem duas alternativas operacionais, operação com “mini-contratos”, contratos unitários com valor financeiro reduzido (apenas 20% do valor financeiro de um contrato padrão), ou “contratos padrão” (também chamados de “cheios” ou “grandes”), que além de bem mais valiosos, ainda são negociados em lotes mínimos de 5 contratos. Ao entrar nos limites operacionais de alavancagem, o uso de contratos padrão junto com mini-contratos passa a ser necessário.
Os contratos futuros possuem uma alavancagem padronizada pela BM&FBovespa de aproximadamente 5 vezes para operações de mais de um dia, chamadas de swing-trade. Isso significa que se comprarmos R$ 10 mil em Ibovespa Futuro hoje (1 mini-contrato) para vendermos amanhã, é obrigatório termos, no mínimo, R$ 2 mil em “margem” para que a operação possa ser efetuada. Esse percentual pode variar e é controlado pela bolsa, dessa forma todas as corretoras seguem o mesmo valor mínimo de alavancagem de swing-trade para contratos futuros.
Para operações em day-trade (compra e venda no mesmo dia) as corretoras são livres para dar a alavancagem que quiserem, desde que elas sejam solidárias ao risco. Em outras palavras, a corretora pode deixar você operar com alavancagem de 100 vezes, mas ela é responsável por garantir que você terá dinheiro para cobrir seus prejuízos, caso contrário é ela que arca com o prejuízo e depois te cobra. Como estamos na era da tecnologia, as corretoras possuem sistemas automatizados de risco, que permitem que façamos operações de day-trade de R$ 10.000 tendo apenas R$ 100 (cem reais) em conta. Isso mesmo, 100 vezes de alavancagem (R$ 100 x 100 = R$ 10.000). Como isso representa 500 pontos de oscilação do Ibovespa Futuro (relativamente grande) o controle pode ser bem feito e podemos nos “alavancar” ao extremo em nossas operações, obtendo ganhos absurdamente altos (se você alavancar 100 vezes sua operação, um ganho de 1% vira 100%, ou seja, dobra o capital em menos de um dia) OU quebrando a nossa conta (perder 1% alavancado 100 vezes é o mesmo que perder 100%, ou seja, TUDO).
Não temos controle sobre tudo, então sempre trabalharemos em nossos cálculos, projeções e simulações com um percentual de “perdas eventuais” que podem ocorrer pelos mais diversos motivos, desde um timer de saída até um dia de operação perdido porque você esqueceu de ligar o robô, por exemplo. Esse percentual normalmente varia de 2 a 10% sobre o resultado do dia. Isso garante que as nossas projeções sejam realistas e também permite que tenhamos uma projeção otimista (com perdas de 2%) e outra projeção pessimista (com perdas de 10%) para a nossa tomada de decisão sobre uma nova configuração de robôs.
Partindo dessas premissas, muita gente prefere não usar a alavancagem de dezenas vezes oferecida pelas corretoras por puro medo de quebrar (e com toda a razão).
Mas e se você pudesse controlar essa superalavancagem? Com perdas controladas e limitadas, mas ganhos muitas vezes maiores do que uma operação alavancada em poucas vezes?
É nisso que vamos nos focar, abrir a possibilidade de extrapolar ganhos, mas limitando perdas. O resultado, como é de se imaginar, são ganhos extremamente altos, mas também ter operações extremamente bem controladas, pois o controle operacional em tempo real será a parte mais importante de toda a sua operação.
A este Supercontrole operacional daremos o nome de “Margem Turbo”. A lógica aqui não é de evitar as perdas, mas aceitá-las, só que dentro de um ambiente controlado e forma parcial, gerando muito mais rentabilidade ao longo do tempo do que uma operação comum onde o objetivo é evitar as perdas. Em tempo, não devemos confundir as perdas da “Margem Turbo” com as perdas diárias da calibração da estratégia, quando estamos calibrando uma estratégia sempre devemos reduzir ao máximo as perdas, não importa qual o objetivo final. Mas é certo que perdas existirão, pois estamos em um mercado de renda variável, e é com essas perdas reais, que existirão quer as tenhamos previsto ou não, que vamos trabalhar e explorar os limites do risco (não se preocupe se você não entender esse parágrafo).
O que precisamos para operar dentro do conceito de “Margem Turbo”? Abaixo um checklist:
Vontade de operar no limite do risco, fazendo tudo o que você pode fazer e espremendo cada centavo do seu patrimônio como lucro. Há pessoas que simplesmente não querem correr riscos, mesmo controlados. Já pensou que há um motivo para os Venture Capitalists (capitalistas de alto risco) serem os donos das empresas e as pessoas que vivem “em segurança” serem assalariados?
Capacidade de entender o que está aqui descrito, se você não entender, não vai conseguir operar, pois isso não é um fundo de investimentos, é uma operação particular.
Ter uma lógica estatisticamente forte para operar dentro de um robô (a operação é baseada em estatística, de forma que é preciso ter algo que opere todos os dias da mesma forma e com boa consistência). No meu caso eu vou usar o Top Hedger, que é uma estratégia de alta qualidade e que possui lógica que opera tanto em índice futuro comprado, como vendido como também em dólar futuro.
Ter todo o capital inicial necessário disponível para o tamanho da operação que você escolher. Não adianta querer arriscar além do limite, estamos andando na fronteira do que é racional, um passo além e vira aposta.
Ter conta em uma corretora que permite o uso de “Superalavancagens” de 100 vezes, ou mais, no day-trade. Sem isso a lógica não pode ser aplicada.
Há diversas corretoras que disponibilizam a alavancagem necessária, vou desenvolver a raciocínio usando as margens de day-trade da corretora XP, de R$ 90 para mini-contratos de Ibovespa Futuro (±111 vezes de alavancagem) e R$ 150 para mini-contratos de Dólar Futuro (±245 vezes de alavancagem).
Primeira regra:
Dividir o nosso capital em 4 partes, sendo a primeira parte a margem mínima e obrigatória da corretora (“Margem Turbo”), esta primeira parte jamais poderá ser perdida (pois sem ela não conseguimos operar). Devemos operar o máximo possível (que a corretora permitir) de contratos dentro dessa “Margem Turbo” (que é igual a um quarto do nosso capital inicial).
As outras 3 partes deverão ter o mesmo tamanho da primeira e cada uma delas deverá ser suficiente para tocar a operação completa. A lógica aqui é simples, vamos alavancar o nosso capital muitas vezes, se a operação der certo vamos duplicar, triplicar ou até mais cada parte investida logo no primeiro mês. Se der errado, a primeira parte vai ser perdida em prejuízo, essa parte vai para o “sacrifício”, mas teremos outras duas partes para recomeçar a operação.
Exemplo:
Capital Inicial: R$ 100 mil
Divisão das partes (4 partes iguais)
A primeira parte (verde, “Margem Turbo”) é o mínimo para se operar, essa parte deve permanecer íntegra durante toda a operação (não poderá ser perdida). As demais partes serão usadas conforme necessidade no início da nossa operação, se a lógica funcionar já no primeiro mês, usaremos apenas R$ 50 mil de margem e teremos retorno suficiente para sacarmos. Caso tenhamos prejuízo no começo, temos 2 novas tentativas garantidas com as duas partes restantes.
Aqui já dá pra notar que muita gente vai querer dividir o capital inicial em apenas 2 partes e apostar que vai ter lucro no primeiro mês e “ganhar” as duas partes restantes no mercado. Isso não deve ser feito, pois nas próximas regras veremos que o risco será extremo, se não tivermos o controle estatístico garantido pela primeira regra, o risco de perdermos TUDO passa a ser muito alto.
Sugestão de alocação para cada parte:
Parte 1 (R$ 25 mil): Algum título de renda fixa que a sua corretora aceite como margem e que possa ser sacado de um dia para o outro (como um CDB).
Parte 2 (R$ 25 mil): Sugestão que fique em dinheiro na conta para os ajustes diários de lucros e prejuízos.
Partes 3 e 4 (R$ 50 mil): Podem ficar em qualquer aplicação de liquidez diária, na corretora ou no seu banco mesmo, como um Fundo DI. Só será necessário mexer nessa aplicação se a Parte 2 for perdida logo no primeiro mês da sua operação. (Repetindo, eu recomendo que essas Partes 3 e 4 realmente existam.)
Segunda regra:
Operar todos os contratos que a primeira parte permitir. Não importa se operaremos contratos comprados ou vendidos, de Ibovespa ou Dólar Futuro, vamos dividir a margem da primeira parte igualmente para cada contrato operado (na prática usaremos apenas um quarto da margem máxima potencial que a corretora nos oferece, pois apenas um quarto do nosso dinheiro será alocado nisso).
Temos 3 tipos de operações possíveis no Top Hedger: Venda de Ibovespa Futuro, Compra de Ibovespa Futuro e Venda de Dólar Futuro. Vou alocar a mesa quantidade de contratos para cada parte, da seguinte forma:
Isso é uma sugestão, é possível dividir essa margem de muitas formas, inclusive concentrando tudo em dólar ou em índice. Cada pessoa deve escolher a sua própria divisão de lógicas operacionais e realizar as suas simulações.
Calculando a margem necessária:
Ibovespa Vendido: R$ 90 x 75 mini-contratos = R$ 6.750
Ibovespa Comprado: R$ 90 x 75 mini-contratos = R$ 6.750
Dólar Vendido: R$ 150 x 75 mini-contratos = R$ 11.250
TOTAL = R$ 24.750
Tínhamos R$ 25 mil para alocar no limite da alavancagem e conseguimos alocar praticamente tudo, e assim será nossa operação.
Novamente, muita gente vai querer ignorar a margem necessária do Ibovespa Comprado ou Vendido, alegando que, como conceitualmente uma operação anula a outra, as margens sobrepostas são desnecessárias e, logo, R$ 6.750 seriam desnecessários, baixando o valor total da parte para R$ 18.000 e, consequentemente, reduzindo o investimento inicial para 4 x R$ 18.000 ou R$ 72.000. E novamente, isso não deve ser feito, as operações compradas e vendidas podem ter prejuízos simultâneos no mesmo dia (supondo que uma opere de manhã e tenha prejuízo e a outra opere de tarde e também tenha prejuízo), o que abre a necessidade de termos as duas margens calculadas de forma independente. Então, sugiro fortemente que não façamos essa compensação entre margens.
Terceira regra:
Se uma parte quebrar ou ficar abaixo do percentual de controle estipulado para as “perdas eventuais”, deveremos parar de operar e esperar a estratégia se recuperar antes de recomeçarmos a operação usando uma nova parte.
Exemplo: Se estamos operando com R$ 25 mil de “Margem Turbo” e temos um percentual de controle para “perdas eventuais” de 5%, isso significa que se esta margem ficar abaixo de R$ 1.250 nós devemos paralisar a operação e recompor a margem assim que o valor teórico das próximas operações volte a ficar acima de R$ 1.250. A minha sugestão é para que o percentual usado seja de 5%, mas não é realista usar nem menos de 2% e nem mais de 10%.
Quarta regra:
Por usar muitos contratos, devemos, sempre que possível, usar contratos grandes na operação em detrimento dos mini-contratos quando formos usar poucos robôs.
Exemplo:
Ibovespa Vendido: 75 mini-contratos = 15 contratos padrão, ou 3 lotes de 5 contratos
Ibovespa Comprado: 75 mini-contratos = 15 contratos padrão, ou 3 lotes de 5 contratos
Dólar Vendido: 75 mini-contratos = 15 contratos padrão, ou 3 lotes de 5 contratos
Desta forma, no nosso exemplo, teríamos 3 lotes de contratos grandes para dividir em cada operação, podendo operar 3 robôs vendidos em índice, 3 robôs comprados em índice e 3 robôs vendidos em dólar. Caso o interesse seja por manter a operação nos mini-contratos, eu sugiro que se divida o máximo possível as quantidades, se possível em 75 robôs para cada tipo de operação (1 mini-contrato por robô). Isso só será possível se houver tantos robôs quanto necessário em cada ponta operada, caso contrário será necessários usarmos menos robôs e voltar a tentar usar os contratos grandes.
Quinta regra:
Lucrou, sacou! Nada de reinvestir os lucros no longo prazo.
Aqui, mais uma vez, muita gente tentará reinvestir os lucros até chegar aos lucros mensais milionários (o que é errado). Exemplo: Comecei com R$ 50 mil, fiz lucro de R$ 50 mil em 3 meses e estou com R$ 100 mil. Neste caso, decido dobrar minha posição (não saco nem um centavo do que ganhei) e usar todos os R$ 100 mil como margem.
RISCO: Ter prejuízo logo após aumentar a quantidade e ter que usar novas partes operacionais, alongando a data do primeiro saque em alguns meses e minando o seu psicológico. Se você ficar mais 3 meses sem sacar nada, já terão sido 6 meses sem saque algum, desde o início, o que o obrigará, inevitavelmente, a repensar sua estratégia. Isso poderá te levar a desistir de algo que está funcionando, justamente porque você jogou os saques para o futuro e o futuro está demorando a chegar.
Entendendo o risco acima descrito, acredito que fazer esse reinvestimento uma vez ou duas será uma opção aceitável para muita gente. Mas montar uma planilha com reinvestimentos eternos até chegar nos ganhos mensais milionários é pura insensatez. Se esse sentimento te dominar, vá de frente ao espelho e se dê um tapa na cara.
Sexta regra:
Não invente novas regras, não mude de robôs no decorrer dos meses, não saque mais dinheiro do que você ganhou e não aumente ainda mais a alavancagem. Simplesmente tenha disciplina e não deixe o seu ego destruir o modus operandi nos meses em que o lucro for farto e nem deixe o seu psicológico abandonar o barco nos meses em que uma das suas 4 partes quebrar.
Abaixo links de simulações de uso do nosso exemplo de R$ 100 mil com custos de corretagem, custos fixos e perdas eventuais de 5% (realista) e de 10% (propositalmente pessimista). É importante analisar a dinâmica das operações no dia-a-dia e se preparar para o que virá no mundo real. A “Margem Turbo” nos permite operar, normalmente, a 150% da capacidade inicialmente estipulada para uma estratégia em mercados futuros. Isso é muito e, apenas por curiosidade, no nosso exemplo o financeiro total de uma operação completa seria de R$ 3.075.000 (três milhões e setenta e cinco mil reais), ou 31 vezes de alavancagem. Para comparar, saibam que a alavancagem média recomendada para a operação padrão do Top Hedger gira em torno de 10 vezes, o que significa que estamos “turbinando” a nossa operação usando esta técnica, daí o nome “Margem Turbo”.